continuação
SEGUNDO ARTIGO (sobre os exercícios orais)
* Este artigo compôs um folheto distribuído
no I Congresso Internacional de Fonoaudiologia de Guadeloupe (Caribe Francês),
em março/1996, com o texto da palestra da Autora nesse Congresso).
TERAPIA
MIOFUNCIONAL OROFACIAL - MÉTODO PADOVAN
(REORGANIZAÇÃO
NEUROFUNCIONAL)
Aqui é descrito um
sistema de terapia para melhorar a respiração nasal, a capacidade de sucção, a
mastigação, a deglutição, a fala e as funções dos músculos orofaciais. Os
exercícios terapêuticos não requerem cooperação consciente, podendo dessa forma
serem usados com bebês ou com deficientes graves. São detalhadas novas
estratégias para ajudar pacientes a eliminarem os maus hábitos bucais.
Os seres
humanos usam a boca para diferentes funções:
FUNÇÕES DE NUTRIÇÃO - Respiração,
Sucção, Mastigação e Deglutição. Estas funções são vitais para o ser humano e
são chamadas Funções Reflexo-Vegetativas orais (FRV).
FUNÇÕES
DE RELAÇÃO ou DE COMUNICAÇÃO - estas funções incluem:
* a mímica
expressiva
* a fala.
FUNÇÃO
MORFOGENÉTICA - esta função da boca diz respeito à forma das arcadas dentárias.
FUNÇÕES DE RELAÇÃO ou DE COMUNICAÇÃO - Vamos começar nossa análise pela produção da fala.
Fala é a linguagem oral articulada e consiste na emissão da voz e na articulação
da palavra. Sabemos que, embora a palavra articulada e codificada seja peculiar
ao ser humano, o homem não desenvolveu nenhum órgão específico para esta
atividade.
A fala é uma função originada de uma
adaptação de dois sistemas vitais:
* o
Sistema Respiratório e
* o
Sistema Digestivo.
A voz
humana é produzida pelo Sistema Respiratório. A corrente de ar vem dos pulmões
e, quando alcança a laringe, produz a voz pela vibração das cordas vocais.
Na parte
inicial do Aparelho Digestivo - a boca e suas estruturas - o som ou é
modificado pela maior ou menor abertura da boca, formando as vogais, ou é
interrompido em diferentes pontos, formando as consoantes. Estes são os pontos
de articulação dos fonemas - que são os mesmos pontos usados no processo da alimentação
- as bilabiais no ponto de apreensão do alimento e os outros fonemas nos pontos
tocados pela língua durante o ato da deglutição.
Os
mecanismos usados para comer e para falar são exatamente os mesmos. As FRV são consideradas pré-linguísticas
porque preparam os órgãos fonoarticulatórios, adaptando-os para a produção da
fala.
FUNÇÃO MORFOGENÉTICA - Por outro lado, as FRV, adequadamente desenvolvidas e funcionado dentro de seus
padrões corretos, vão influenciar beneficamente a forma das arcadas dentárias.
Os dentes
são mantidos em equilíbrio e em harmonia por duas forças musculares
antagônicas:
·
uma força
de contenção interna, que é a língua
·
uma força de contenção externa,
formado pelo MECANISMO DO
BUCINADOR, que é a faixa muscular que contorna os dentes.
Essas
duas forças têm que estar em equilíbrio. E a ação modeladora desses músculos é
exercida tanto em repouso quanto em função.
Durante a postura de repouso, deve
haver um suave contato labial, a ponta da língua deve permanecer na papila
incisiva e deve haver uma aproximação do dorso da língua com o palato,
conservando em equilíbrio os componentes musculares internos e externos.
O
equilíbrio dos músculos quando em função diz respeito às FRV de respiração, sucção, mastigação e deglutição.
Devemos
aqui lembrar que os chamados MAUS HÁBITOS BUCAIS (descritos como etiologia
funcional de algumas deformidades dento-faciais) são desvios dessas funções:
* Respiração - RESPIRAÇÃO BUCAL
*
Sucção - CHUPAR DEDOS e/ou CHUPETA
* Mastigação - BRUXISMO, ONICOFAGIA, MASTIGAÇÃO
UNILATERAL, MORDER
OBJETOS (os mais variados)
*
Deglutição - DEGLUTIÇÃO ATÍPICA.
Aqui podemos ver muito claramente a
ligação entre a Odontologia e a Fonoaudiologia. Este elo é representado pelas FRV. Estas funções são consideradas
pela Fonoaudiologia como pré-linguísticas, enquanto que a Odontologia as
considera como funções responsáveis pela estabilidade dos dentes nos seus
corretos ângulos de inclinação axial.
O MÉTODO
Durante 6
anos (1969-1975) trabalhei na Universidade de São Paulo (USP), onde dava aulas
para alunos de Pós-Graduação em Ortodontia. Lá desenvolvi meu método de
Mioterapia Neurofuncional e o tenho aplicado desde então, com excelentes
resultados, mesmo com pacientes em coma, porque sua participação é reflexa e
não consciente ou voluntária. O método foi inicialmente publicado na
"Revista de Ortodontia", São Paulo, em 1976.
Alguns pesquisadores, desde o início
do século, notaram que, muitas vezes, ocorriam recidivas em casos tratados
ortodonticamente. Angle (1907) observou que o hábito de deixar a língua entre
os dentes ou deixar que ela se projetasse, causava dificuldades em completar o
tratamento ortodôntico.
Outros autores mostraram interesse
pelo assunto. Foi, no entanto, a partir das pesquisas feitas por Straub,
Garliner, Hanson e outros, nos Estados Unidos, e por Cahuépé, na França, durante a década de 1960, que esse assunto tornou-se
mais importante.
Muitos métodos foram desenvolvidos e
publicados desde então. A maioria dos métodos de tratamento miofuncional são
direcionados para a reeducação da deglutição atípica e para o estabelecimento
da postura de repouso normal da boca.
Alguns programas consideram também a
respiração. Há mesmo algumas "práticas estratégicas" propostas para
"fechar a boca do paciente".
Não há, entretanto, nenhum método, do
qual eu tenha conhecimento, que use a mastigação como terapia, a não ser a
recomendação para o paciente mastigar bem durante as refeições.
No que diz respeito à sucção, deu-se,
acertadamente, muita importância à amamentação natural. Mas, por outro lado, é freqüente um mau hábito de sucção somente ser tratado para a
eliminação específica desse hábito. Não encontrei qualquer referência quanto ao
uso da sucção de chupeta como um exercício terapêutico. Contudo, na metodologia
Padovan, a chupeta ortodôntica tem sido usada como uma efetiva ferramenta
terapêutica desde 1972 (devemos ter sempre em mente que todas as FRV usam os mesmos músculos e os mesmos
impulsos nervosos).
Era, para
mim, surpreendente que os autores, ao tratarem da mioterapia orofacial, somente
se referissem à reeducação da deglutição atípica. Era também surpreendente que
os autores afirmassem que essa reeducação deveria começar somente após a idade
de 7 anos, quando o paciente já estaria apto a colaborar.
Uma
criança de 7 anos de idade que fosse deglutidor atípico já teria certamente
desenvolvido, nestas alturas, uma deformidade dentofacial, ou maloclusão.
Porque, então, não administrar antes disso uma terapia preventiva?
Além de pensar nesse trabalho preventivo,
considerei também outros pacientes portadores de diferentes patologias, como
Síndrome de Down, paralisia cerebral, distúrbios de desenvolvimento e mesmo
doença mental, que apresentavam deglutição atípica e, em geral, tinham ainda
todas as suas FRV alteradas. Algumas dessas crianças eram incapazes de soprar
ou de sugar, tinham dificuldade de mastigar, fala desordenada e vários tipos de
maloclusão. Assim, como poderiam ser capazes de colaborar, repetindo os
exercícios recomendados para o treino da deglutição?!...
Considerando cuidadosamente todos
esses fatos, o Método Padovan foi desenvolvido como uma modalidade de
tratamento no qual todas as funções bucais são levadas em consideração e que
pode ser aplicado, dentro do campo de atuação da Fonoaudiologia, para qualquer
tipo de paciente, com qualquer tipo de patologia e em qualquer idade.
Neste Método, todas as FRV são exercitadas em cada sessão
terapêutica. Nunca somente uma dessas funções é trabalhada isoladamente, desde
que todas elas são dependentes dos mesmos músculos e dos mesmos impulsos
nervosos. Se uma dessas funções está alterada, as outras provavelmente
mostrarão patologias correlatas. E o bom funcionamento de uma função será
certamente uma ajuda para as demais.
Quando usando este Método, é
importante que o terapeuta não deixe o paciente ficar consciente de suas
próprias dificuldades. Pelo contrário, o terapeuta deve usar os próprios
reflexos do paciente para estabelecer adequadamente as funções.
ALGUNS EXERCÍCIOS DO MÉTODO
Vamos
descrever aqui somente alguns exercícios. Há muitos outros, é claro. O material
usado na metodologia Padovan é muito simples e pode ser encontrado em qualquer
lugar: - línguas-de-sogra, chupetas ortodônticas, garrotes de diferentes
diâmetros e comprimentos, espátulas, pedaços de hóstia, catéteres, elásticos
ortodônticos, canudos de refresco, um pequeno massageador facial e apitos de
madeira.
RESPIRAÇÃO - O terapeuta deve levar em conta todo o trato respiratório, do
diafragma até o nariz e a boca. O paciente não deve conscientizar-se dos
padrões de respiração ou do objetivo do terapeuta ao conduzir os exercícios.
Num dos
exercícios, o paciente recosta-se confortavelmente numa poltrona especial que
lhe permita ficar quase deitado. O terapeuta pede-lhe que pronuncie as vogais,
uma por uma, enquanto lhe aplica, com a mão, pequenas pressões na região do
diafragma (no abdômen. abaixo
do esterno). Esse pressionamento interrompe o som e estimula simultaneamente o
diafragma e as cordas vocais.
A língua-de-sogra
é usada em exercícios para aumentar a capacidade pulmonar. Exercícios para restabelecer o fluxo nasal são feitos com a língua-de-sogra nas
narinas. O paciente fecha os lábios, oclui uma das narinas com o dedo e coloca
a língua-de-sogra na outra narina. O paciente sopra com o nariz para esticar a
língua-de-sogra e a conserva inflada tanto quanto possível. Quando a
língua-de-sogra desinfla, é imediatamente removida e assim o paciente respirará
automática e profundamente pela narina aberta. Este exercício é repetido uma
quantidade variada de vezes, dependendo do paciente.
SUCÇÃO - Uma chupeta ortodôntica especial é usada para estimular a sucção. A
chupeta ortodôntica permite a sucção mas não deforma as arcadas dentárias.
Os
exercícios com chupeta atingem todos os músculos faciais e aqueles que suportam
a cabeça. O mecanismo da sucção é sinérgico. Para que a sucção seja eficiente é
necessário que seja contínua e rítmica. O tonus muscular é melhorado pela
sinergia e ritmo da contração e do relaxamento alternados. Os exercícios são
realizados com acompanhamento de poemas rítmicos, recitados pelo terapeuta,
incorporando dessa forma o ritmo nos movimentos padrões do paciente. Nunca se
deve oferecer uma chupeta a um paciente, ou dar-lhe um exercício para fazer,
sem o acompanhamento do terapeuta. A sucção deve ser monitorada para se ter a
certeza que os movimentos estão sendo executados adequadamente. Para tornar a
sucção mais vigorosa, a chupeta deve ser levemente puxada para fora.
MASTIGAÇÃO - Um pedaço de garrote cirúrgico é usado para exercitar os músculos
mastigatórios. O garrote é colocado transversalmente na boca para que os
molares de ambos os lados estejam em contato com ele. Depois do exercício de
mastigação bilateral, o paciente mastiga unilateralmente, com o tubo dobrado e
com as pontas inseridas entre os molares de um lado, depois do outro. Quando
colocado anteriormente, as pontas do garrote tocam a ponta da língua
provocando, durante a mastigação, um efeito de ventosa, que é um estímulo benéfico.
A mastigação deve ser feita mais tempo com os dentes posteriores do que com os
anteriores.
DEGLUTIÇÃO - O "Exercício de Deglutição Reflexa" estimula os músculos
supra e infra-hioideos assim como os posteriores da língua. No momento da deglutição, os músculos supra e
infra-hioideos elevam o hióide (...e sabemos quão importante é a elevação do
hióide para a evaginação da faringe durante o ato normal da deglutição!...).
Injeta-se água na boca do paciente
enquanto a língua é mantida e empurrada para trás com uma espátula. Pede-se ao
paciente para, primeiro, gargarejar rapidamente, a fim de levar a água para uma
posição onde ela desencadeie o reflexo de deglutição, deglutindo em seguida.
Com este exercício, o paciente torna-se capaz de levar a língua para trás sem o
auxílio da espátula e de desencadear o reflexo de deglutição. Desse momento em
diante, a posição da ponta da língua do paciente torna-se irrelevante para
iniciar a deglutição. A seguir, é direcionado o posicionamento correto da ponta
da língua. Com este exercício, os mecanismos da deglutição normal são
rapidamente estabelecidos. Podemos dizer que este exercício trabalha como um
facilitador para qualquer outro tipo de exercícios de deglutição.
EXERCÍCIOS ESPECÍFICOS - Há muitos exercícios específicos para estimular e
fortalecer a musculatura buco-facial.
Um deles
é muito importante para melhorar a propriocepção da língua, assim como a
propulsão e a retração da mesma. Um elástico ortodôntico é colocado ao redor da
língua. O paciente começa a retrair a língua, fazendo o elástico escorregar
para a frente até que saia fora. Se o paciente precisar de ajuda inicialmente,
para estabelecer este padrão de movimento, um canudo pode ser colocado no
elástico e puxado levemente para fora pelo terapeuta.
MAUS HÁBITOS BUCAIS - Falemos agora em como eliminar, com este Método, os
maus hábitos bucais.
De acordo
com minha concepção, se uma pessoa mostra um mau hábito de sucção e/ou
mastigação é porque as respectivas funções não foram completamente satisfeitas
e amadurecidas na idade apropriada.
Dessa
forma, para eliminar qualquer mau hábito, vamos primeiro exercitar todas as
funções (não devemos esquecer que elas são mutuamente dependentes...). Depois
vamos exercitar mais aquelas funções que não amadureceram adequadamente.
Assim,
mais exercícios de sucção são feitos com quem sugue dedo ou chupeta, exercícios
de mastigação são intensificados com pacientes com bruxismo ou que roem unha, e
assim por diante.
Porém
sempre todas as funções são exercitadas. Exercitando as funções pelas próprias
funções, evidentemente todos os músculos estão sendo ativados de forma natural.
A resposta, o resultado, freqüentemente nos surpreende.
Em
resumo, trabalhando as funções pelas próprias funções, naturalmente todos os
músculos estão sendo ativados com a sua linguagem própria. Isso fixa
adequadamente a função correta na memória neurológica. "E quanto mais cedo
medidas terapêuticas forem tomadas e a função correta for usada, mais firme
será sua fixação no SNC e, quanto mais tarde, mais difícil será para
restabelecer uma função normal de mastigação e deglutição" (Moyers, 1958).
Por conseguinte, é preferível trabalhar com o paciente tão cedo quanto
possível.
Não
devemos esquecer que "nenhuma correção ortodôntica pode ser adequadamente
mantida, a menos que a oclusão ótima obtida no fim harmonize com a musculatura
do paciente" (Moyers). Os músculos constituem o melhor e o mais seguro
aparelho de contenção para os dentes.
FINALMENTE,
gostaria de dizer que minha intenção aqui não é apresentar somente mais um
método de pesquisa, porém de deixar que a filosofia deste Método permaneça com
vocês como uma mensagem.
Dois
pontos a ressaltar:
PRIMEIRO - considerar o ser humano como um todo.
A
musculatura é toda interligada através do corpo. Por exemplo, sabemos que o
respirador bucal apresenta alterações posturais e pode ter até uma tendência
para pé chato e "halux valgus".
Assim,
todos os pacientes em tratamento não fazem só exercícios para a boca e suas
funções. Fazem sempre, também, exercícios para o corpo todo, através da
Reorganização Neurofuncional, que consiste na recapitulação das fases do
desenvolvimento neurológico normal: movimentos primários, rolar, rastejar,
engatinhar, andar tosco, andar cruzado, etc.
SEGUNDO - este Método segue uma linha de acordo com a Natureza.
Os
exercícios corporais consistem de movimentos da seqüência geneticamente programada do desenvolvimento humano
normal.
Os
exercícios orais são feitos seguindo a mesma filosofia, isto é, treinando as
funções pelas próprias funções, porque seus movimentos são também parte do
programa genético humano.
Eu
gostaria de concluir dizendo que AQUELE QUE SEGUE O QUE A SÁBIA NATUREZA NOS MOSTRA E ENSINA TEM MENOS CHANCES DE
ERRAR!
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